terça-feira, 4 de setembro de 2012

Religiosos versus ateus






Por Francisco Fernandes Ladeira em 04/09/2012 na edição 710 do site Observatório da Imprensa



Na noite de segunda-feira (27/8), o programa SuperPop, exibido pela Rede TV!, apresentou um polêmico debate entre religiosos e ateus. De um lado, o padre Paulo Gonzalez, o pastor Antônio Silva e o sacerdote da umbanda Pai Syrus defendiam, veementemente, a existência de Deus. De outro lado, Daniel Sottomaior e Fabio Queiroz (membros da Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos – Atea) negavam, de modo não menos enfático, a existência de qualquer ser metafísico. “O programa de hoje é polêmico. Dizem que religião não deve se discutir. Mas vamos discutir. Vamos discutir a existência, ou não, de Deus. O que leva um evangélico a crer em Deus? O que leva um ateu a negar a existência dessa força superior?”, anunciou a apresentadora Luciana Gimenez.

Não pretendo, neste breve artigo, defender nenhuma das duas posições. Muitos ateus, ao adotarem incondicionalmente os axiomas científicos, podem ser tão fundamentalistas quanto os fanáticos religiosos. Porém, o que mais chamou a atenção no programa da Rede TV! foram as histórias fantasiosas relatadas por alguns religiosos. Para o umbandista Pai Syrus, “há pessoas com o diabo no corpo, e isso destrói vidas e casamentos. Há duas classes de espíritos que induzem à sexualidade deturpada. Eles se alimentam da energia sexual”. Opinião análoga foi compartilhada pelo pastor Antônio Silva. Segundo ele, muitos maridos traem suas esposas porque podem estar com o “diabo no corpo”.
Por sua vez, a empresária Marisa Cruz afirmou ter visto Deus durante uma experiência de quase morte. “A minha história é a prova real de que existe uma força superior muito maior do que todos nós. Cheguei a um lugar onde um homem disse que eu poderia escolher entre voltar [para a Terra] ou ficar [no céu]. [Posteriormente] uma entidade me trouxe de volta [à vida].” Por outro lado, ao ser interpelado sobre o ocorrido com Marisa Cruz, o padre Paulo Gonzalez salientou que o relato da empresária pode ser consequência de delírios oníricos. “É algo que está dentro do inconsciente dela, nada mais do que isso”, concluiu.

“A Bíblia prova que Jesus é um ET”

Não obstante, de acordo com uma matéria apresentada durante o programa, duas crianças estadunidenses asseguraram ter presenciado a “palavra de Deus”. Logan Henderson afirmou ter recebido, através de uma visão, uma mensagem de Deus. Já Colton Burpo, filho de um pastor metodista, disse ter ido ao céu e conversado com Jesus.
No entanto, a história mais miraculosa apresentada no SuperPop foi a do pastor Marcos Pereira da Silva, que garante expulsar demônios e controlar rebeliões em presídios, delegacias e internatos de menores. O religioso afirma que sua trajetória de pregações começou após um encontro com Satanás na sala de sua casa. Segundo ele, o demônio afirmou que levaria a sua alma para o inferno. Diante do ocorrido, Marcos se converteu e, desde então, se dedica à recuperação de pessoas que denigrem a palavra de Deus.
Por outro lado, Leo Mark, que é ateu, apontou que Jesus foi um extraterrestre. “A Bíblia prova que Jesus é um ET. Civilizações passadas não conseguiam diferenciar naves espaciais de manifestações ‘divinas’.”

Monopólio de uma religião

Como era de se esperar em um debate extremamente acalorado, ateus e religiosos não cederam às posições alheias e mantiveram suas respectivas convicções. No final do programa, a apresentadora Luciana Gimenez ainda tentou apaziguar os ânimos: “Fazer o bem não faz mal à ninguém. Tem muita gente que crê e não faz, e tem muita gente que não crê, e faz. Na dúvida, vamos fazer o bem, não importa qual religião, se tem a Bíblia, se não tem.”
Entretanto, como bem frisou Rodrigo Dias, em um comentário no Observatório da Imprensa, “as mitologias monoteístas são desrespeitosas por definição, algo que as mitologias politeístas nunca foram. Ora, quem acha que só existe um deus (o seu), divide o mundo entre quem crê consigo e quem não crê consigo. No politeísmo a diversidade de divindades é a regra, e assim diferentes culturas podem conviver lado a lado sem nenhuma achar que está mais certa que as demais”.
Desse modo, em última instância, se realmente existe uma força superior, ela não pode ser, em hipótese alguma, monopólio de uma religião em particular.
***
[Francisco Fernandes Ladeira é especialista em Ciências Humanas, Brasil: Estado e Sociedade pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e professor de História e Geografia em Barbacena, MG]


Leia também:

Hitler e a Religião



Nenhum comentário:

Postar um comentário